Restauração Ecológica
As árvores deram sementes, mesmo em plena pandemia
27 de set. de 2020
Cada uma das três espécies ameaçadas de extinção e selecionadas no projeto de preservação liberou sementes entre maio e setembro
Por Tânia Rabello

O jacarandá-da-bahia (Dalbergia nigra); o cedro-do-brejo (Cedrela odorata) e o jequitibá-rosa (Cariniana legalis) não “sabem” que o mundo – incluindo o Brasil – ficou praticamente paralisado no primeiro semestre por causa da pandemia de covid-19. Seguiram, assim, seu ciclo natural de produção de sementes, como manda a natureza. Desta forma, os coletores deste material genético tiveram de se adaptar às regras de prevenção ao coronavírus e ao isolamento social para não perder a oportunidade de dar andamento ao projeto de preservação dessas três espécies nativas da mata atlântica, retirando as sementes das árvores no tempo certo para posterior propagação.A coleta de sementes foi feita em abril/maio para o cedro-do-brejo; em julho/agosto para o jacarandá-da-bahia e em agosto/setembro para o jequitibá-rosa, conta o diretor de projetos da Frepesp, Guaraci Diniz. O projeto de preservação dessas espécies ameaçadas de extinção, realizado pelo Jardim Botânico Araribá (JBA) e pela Federação das Reservas Ecológicas Particulares do Estado de São Paulo (Frepesp), em parceria com o Botanic Gardens Conservation International (BGCI), do Reino Unido, e com financiamento da Fondation Franklinia, da Suíça, prevê a formação de 2.500 mudas, que serão plantadas em 180 hectares de Reservas Particulares do Patrimônio Natural (RPPNs) parceiras do projeto: a RPPN Duas Cachoeiras, em Amparo; a RPPN Fazenda Serrinha, de Bragança Paulista; a RPPN Estância Jatobá, de Holambra; a RPPN Amadeu Botelho, de Jaú; a RPPN Porto do Ifé, de Colômbia, e a RPPN Renópolis, de Espírito Santo do Pinhal. Além delas, são parceiros o viveiro Ambiental Mudas, de Araraquara, e o viveiro Oiti, de Holambra, e o Jardim Botânico de Jundiaí.

Thiago P. Pires, engenheiro florestal coordenador geral e um dos coletores de sementes do Jardim Botânico de Jundiaí, conta que, tendo em vista o fechamento de áreas de conservação para visitação por causa da pandemia de coronavírus, teve de recorrer, em alguns casos, a árvores que estavam produzindo sementes em praças públicas. “Consegui, o apoio da prefeitura de Jundiaí, um caminhão com uma cesta elevatória para me erguer até o alto da copa do jequitibá-rosa em Jundiaí”, diz Thiago, lembrando que um jequitibá-rosa pode alcançar até 50 metros de altura. É a espécie arbórea mais alta das

matas nativas paulistas. Em matas fechadas, entretanto, esse trabalho de alcançar a copa das árvores é feito por meio de equipamentos de escalada e de um equipamento chamado “podão”.
De todo modo, as coletas foram feitas pelos “heróis da quarentena” Thiago Pires, do Jardim Botânico de Jundiaí, Emilson Rabelo, do Ambiental Mudas e Flores Welle, do viveiro Oiti. O trabalho, conta Emilson, não poderia ser adiado porque cada semente tem o momento certo de coleta. “Se não fosse feito nesse período, certamente o trabalho teria de ser transposto para o ano que vem.”
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Reuniões antes da pandemia... Ainda não era necessário o uso de máscaras....[/caption]
Guaraci, do JBA/Frepesp, acrescenta que, coletadas as sementes – foram 24.000 obtidas entre abril e setembro –, seguindo-se todas as regras e legislação ambiental para se coletar material propagativo de espécies vegetais, elas foram semeadas nos viveiros Oiti e Ambiental Mudas e já começam a se transformar em pequenas mudas. “Houve todo um trabalho de registro em fichas de campo dos procedimentos, desde a localização das árvores matrizes até a sua identificação, coleta de sementes de quais plantas e anotações sobre como foi feita a quebra de dormência desse material”, relata Guaraci. A equipe responsável pelo registro técnico é a engenheira agrônoma Eliana A. Mattos e Luiz H. Baqueiro, biólogo, ambos do Grupo de Estudos e Ações Ambientais (GAEA), de Amparo (SP). “Esse pessoal, parceiro do projeto, também está obtendo mais dados sobre as condições atuais em nosso ecossistema dessas espécies ameaçadas de extinção”, comenta Guaraci. A proposta, ao fim, além do plantio das mudas em áreas de preservação, é reunir documentos e publicar um protocolo de propagação que oriente e facilite o trabalho de possíveis futuros multiplicadores de sementes dessas três espécies. “Queremos deixar um registro para o futuro”, finaliza Guaraci, do JBA.




Jardim Botânico Araribá